terça-feira, 10 de março de 2009

O mundo diante dos olhos.


Semana passada recebi um telefonema de um grande amigo saxofonista, colega de faculdade da época de Berklee e hoje também montador de filmes; Marcio Soares.
É engraçado que, toda vez que ouço a voz dele ao telefone, imediatamente lembro das horas e horas diárias na practice room com a guitarra nas mãos, do frio da New England, das fantásticas aulas com os professores Ed Tomassi ( "you dig??"), Mick Goodrick, Hal Crook, dos divertidíssimos ensembles e concertos nas salas 1A, 1W e BPC...dos intervalos e cafés do Starbucks da Mass. Avenue ou daquele Bagel com cream cheese no Dunkin' Donuts ( que, acreditem, é muito diferente dos daqui... até hoje não sei porque). Lembro do primeiro semestre de arranjo "Chord Scales Voicings for Arranging". Éramos em cinco alunos na classe; Anat Cohen, Miguel Zenon, Alon farber, Avishai Cohen e eu. Como nos divertíamos ao gravar os nossos próprios arranjos... uma festa!
E depois de finda a longa jornada de aulas, tínhamos ainda forças para nos reunirmos nas ensembles rooms e tocarmos em animadas Jams que duravam das seis da tarde à meia noite, às vezes duas da manhã... que maravilha!
Parece que de repente me volta aquele filme todo, nítido, cristalino.
Tenho saudade do tempo em que vivíamos música vinte e quatro horas por dia. Durante dois anos e meio tocamos, escutamos, pesquisamos, praticamos música o tempo todo; um bando de malucos.
- Chico? é o Marcio! Tudo bom por aí? -  já disparando o motivo da ligação:
- Você já checou com caaalma ( assim mesmo, enfatizando o "calma") o Google Maps atualmente? É muito impressionante... precisa ver. Por exemplo, se digitar "Boston, Boylston St", abre-se aquele mapa onde visualiza-se a rua, coisa e tal. Até aí nada de mais, não é?
Pois é, acontece que há agora um ícone de um pequeno boneco no alto da página que, clicando e arrastando para uma determinada rua ou lugar... a imagem se abre bem à sua frente, como se você estivesse de corpo presente,  imagem real!!! É inacreditável. Você caminha virtualmente pelas ruas, enxergando um raio de 360º!
Eu pensei comigo "não é possível".
Desliguei o telefone e logo entrei no tal "Maps" digitando um nome de rua assim, para experimentar. Comecei por uma que conhecia bem, onde residi por dois anos e meio: "Edgerly Road". 
E qual não foi minha surpresa, um tremendo susto na verdade, quando a imagem familiar e absolutamente real (como uma fotografia em 360º) pulou na minha tela. Exatamente como meu amigo tinha descrito!
Fui me emocionando, mas ao mesmo tempo ainda um pouco cauteloso, incrédulo... era aquilo mesmo? Continuei clicando, me aproximando do meu ex-edifício, virando para um lado e outro enquanto caminhava, testando o alcance da visão oferecida pelo mapa.
Era tudo como imaginava; o jardim, o meio-fio, a entrada do edifício.
Experimentei ir até o fim da minha rua, virar à direita na Haviland St e "caminhar" em direção à Mass Ave, por um quarteirão, até a Berklee, como tantas vezes havia feito in loco.
A certa altura, já perto da escola, virei o cursor à esquerda, como se virasse a cabeça na vida real, estava ali: Starbucks! Depois virei à direita: Dunkin' Donuts. Não era possível!
Fui mais adiante clicando nas setas para enfim reconhecer... já com um sorriso no rosto, o inconfundível prédio da Universidade. A imagem retratada era de um dia de sol, parecia primavera. Não acreditei.
Fiquei ali, mais de uma hora na frente da tela, os olhos fixos, a cabeça rodando. Explorei as ruas, virando de esquina em esquina, reconhecendo cada cantinho (que surpreendentemente permanecia bem próximo do que guardava em minha memória).
Liguei de volta pro meu amigo Marcio e perguntei:
- Será que dá pra ver quem está tocando no Symphony Hall hoje?
Ele riu - Daqui há uns dois anos, quem sabe Chico... de repente até escutar o concerto virtualmente. Se estiverem tocando um Debussy, melhor ainda!
Mas aí - pensei comigo - talvez prefira estar lá primeiro, ao vivo, vendo e ouvindo, ainda que seja pra enfrentar aquele frio de lascar da New England, para aí sim, voltar pra casa e contemplar a tela... cheio de saudade.



3 comentários:

rogerio santos disse...

Belo Texto e reflexão Chico.
Obrigado por compartilhar...

Vou fazer alguns testes também...rs

Abraços
Rogerio

Luiz Lima disse...

fantastico! um abraço, luiz
p.s. quando vem a italia?

Mecka disse...

Chico,

Estes recursos do Google earth são realmente incríveis.
Imagino a sua emoção e saudade ao visualizar parte da sua vida, sentado aí na cadeira onde deve estar agora e fazer esta viagem no tempo. É, os momentos felizes e bem vividos valem por isso mesmo, quando lembramos sorrimos de novo.
Vamos combinar, para ouvir Debussy tem que ser ao vivo mesmo, mas mesmo que seja virtual, Claude será sempre Claude.Adoro a música impressionista e Debussy com a sua música "erudita" era um jazzista fantástico, quanta harmonia linda, não?
Abs,

Mecka